terça-feira, 9 de junho de 2020

Santa Dulce e Santo Antônio: Uma amizade espiritual


Santa Dulce dos Pobres cultivou uma profunda amizade espiritual com Santo Antônio de Pádua. Desde criança, tinha uma devoção especial a este santo português, recorrendo sempre ao amigo espiritual. Era acostumada a conversar com ele em sua casa, suplicando-lhe ajuda e conselhos. A este santo de popularidade mundial, Irmã Dulce delegou os serviços de tesoureiro espiritual da obra social que o Senhor lhe confiou.
Seguindo o modelo de vida de Santo Antônio de Pádua, a religiosa faz do amor pelos pobres e pela pobreza o ideal da sua missão. Ela demonstra que a caridade aos irmãos e irmãs marginalizados pertence ao caminho da salvação do Reino de Deus. Santa Dulce, assim, ensina que a acolhida e o cuidado para com os pobres ajuda-nos a compreender e a realizar o projeto de Deus, pois, os empobrecidos, marcados pela dura exclusão social, interpelam e evangelizam os cristãos(as).
A religiosa baiana compreendia que o serviço e a solidariedade para com eles oportunizava uma forte experiência místico-espiritual com o Divino. Por isso, insistia com suas filhas espirituais a enxergarem no rosto do pobre, a face de Cristo, ou seja, a verem o mistério do Deus encarnado que, com misericórdia e compaixão, acolhe e cuida das misérias humanas.

Uma história que conta a especial amizade de Santa Dulce com Santo Antônio

Era muito tarde, uma noite de inverno na Bahia, com aquele friozinho, quase uma brisa muito forte, que fazia com que os baianos retirassem seus agasalhos dos armários. Para dezenas de pessoas que ficavam do lado de fora do Convento Santo Antônio, no aguardo de uma ajuda de Irmã Dulce, minadas pela doença e pela desnutrição, apesar de terem recebido uma sopa reconfortante, a temperatura era verdadeiramente cruel.
“Irma Dulce estou com frio!” Gritava um.
“Irmã, pelo amor de Deus, me dê um cobertor.” Ouvia-se outro lamento.
Da janela do seu quarto, depois de sob protestos das demais religiosas, ter que subir para se agasalhar, devido aos problemas pulmonares, ela atirava todos os cobertores que encontrava.
De repente, uma das freiras lhe avisou:
“Irmã Dulce, não temos mais nenhum cobertor nem lençol, a não ser que retiremos dos doentes do hospital.”
“Então” disse Irmã Dulce, “vamos tirar primeiro meu lençol e cobertor de cama, que eles precisam mais do que eu.”
Dizendo isto, sacou as peças e as lançou pela janela a uma pobre que trazia duas crianças pelas mãos.
“Deus lhe pague, irmãzinha! Deus lhe pague!”. Repetia a mulher, agora pelo menos, podendo agasalhar seus filhos.
Do lado de fora o alarido aumentava cada vez mais.
Quase que desesperadamente Irmã Dulce desceu para a capela e, diante da imagem de Santo Antonio, lhe disse: “meu querido protetor, vós que nas noites de inverno, saia pelas vilas da Itália a agasalhar os mais deserdados, sempre encontrando maneira de protegê-los, voltai vossos olhos para os pobres da minha terra, que precisam tanto quanto os da sua época, dando-me uma solução urgente para atendê-los”. Dizendo isto fechou os olhos e continuou a rezar. De repente, ouviu-se o barulho de um carro freando e três baques surdos, na parte interna do pátio do convento.
Assustada ela correu para a rua, a tempo de ver se afastando o motorista que dirigia a Rural Willys. Aquele rosto lhe pareceu familiar, ficou intrigada, mas teve que abrir os imensos fardos, que estavam cheios de cobertores e imediatamente os distribuiu entre as pessoas da porta.
Imediatamente após, voltou para agradecer a Santo Antonio e ao levantar os olhos para o alto, reconheceu naquele rosto, que agora trazia um leve sorriso, a face do motorista que antes vira.
Nesta noite o santo teve incluído no seu currículo, mais uma função: a de motorista.

(trecho extraído do livro “Irmã Dulce dos Pobres” Maria Rita Pontes, 17ª edição).