A palavra de Deus é a fonte primordial de qualquer espiritualidade cristã porque susista a fé, ou seja, a Sagrada Escritura é a raíz da fé que por sua vez, é a base da espiritualidade.
Conforme afirma São Paulo a fé vem da pregação da palavra de Deus (cf. Rm 10, 14-17). Jesus ensina que o autêntico discípulo é aquele que escuta a palavra, a acolhe e a pratica, comparando-o “a um homem sensato que construiu a sua casa sobre a rocha” (Mt 7, 21-27). Portanto, alcançam a felicidade todos aqueles que, ouvem a Palavra de Deus e a observam (cf. Lc 11, 28). Dessa forma, os frutos espirituais são gerados a partir da acolhida da Palavra de Deus, na escuta orante da Sagrada Escritura.
A Sagrada Escritura ocupa lugar central nas reflexões e ações dos Santos. Esses revelam grande zelo e veneração pelos Escritos Sagrados, o que favorecia a intensa intimidade que os mesmos cultivavam com Deus, O conhecimento das verdades divinas ilumina a ação pastoral, espiritual e evangelizadora dos(as) cristãos(as), acarretando um amadurecimento e aprofundamento da fé cristã.
Conhecer
e praticar os ensinamentos de Deus é o compromisso de todo batizado. A Palavra
transmitida e escrita “é lâmpada para os meus pés e luz para meu caminho”,
assim diz o salmo 119. O Espírito Divino inspirou e inspira homens e mulheres
que, como discípulos missionários, encarnam a Palavra de Deus promovendo vida.
A Palavra de Deus feita carne cura, liberta e salva a humanidade e a faz
conhecer o Pai. Esse conhecimento passa pela via da aproximação e de experiência
cristã. O desafio dos(as) cristãos(as) é fazer da Palavra de Deus a sua
prática, entrando na dinâmica da transformação contínua que acontece mediante uma
profunda experiência com Deus.
A
Igreja aponta para o testemunho de pessoas que não somente anunciaram a Palavra
Divina, mas, sobretudo, centralizaram suas vidas no modo de agir de Jesus.
Nesta perspectiva, na vida de Santa Dulce, percebe-se a sua plena identificação
e prática com o ensinamento de Jesus: “Pois tive fome e me destes de comer.
Tive sede e me deste de beber. Era forasteiro e me acolhestes. Estive nu e me
vestistes, doente e me visitastes, preso e viestes ver-me” (Mt 25, 34-36).
Santa
Dulce fez das Obras de Misericórdia, expressas no Evangelho de Mateus capítulo
25, o seu programa de vida. Iluminada por estas palavras, não perdia a
oportunidade para fazer o bem ao próximo, assumia diariamente a atitude do bom
samaritano (cf. Lc 10, 30-37), curvando-se diante das pessoas para curar-lhes
as feridas, saciar-lhes a fome e a sede e diminuir-lhes a tristeza e o
desespero.
A
Palavra de Deus encontrou espaço para ser observada e concretizada na vida de
Santa Dulce dos Pobres, porque ela soube acolher as fragilidades dos irmãos e
irmãs e enxergar, neles, a figura do próprio Cristo que vinha ao seu encontro
nas diversas formas de sofrimento.
Ela
dizia:
Muita gente acha que não devemos dar aos pobres a
mesma atenção que damos às outras pessoas. Para mim o pobre, o doente, aquele
que sofre, o abandonado, é a imagem de Cristo. Sempre recomendo às irmãs, aos
funcionários, que vejam no doente que bate à nossa porta o próprio Jesus e,
assim, façam a ele o que faríamos se Jesus em pessoa viesse nos pedir ajuda ou
socorro. Se olharmos o pobre desta maneira, então todo o aspecto exterior, o
estar sujo, cheio de parasitas, com grandes chagas, não nos incomodará, pois,
na sua pessoa, está presente o Cristo sofredor (SENA, 2011, p. 47).
Desejosa de cumprir os ensinamentos do Mestre, nas reuniões com as irmãs FMSP, lembrava:
“O
grande mandamento é amar o próximo como a si mesmo. O amor não é sentimento,
não é emotividade. O amor é fiel, generoso. (...) Quando vocês virem um pobre,
se doente, encaminhem-no para o hospital, vejam as suas necessidades. Dêem
conselhos, e aí, quando conseguirem a amizade deles, procurem levá-los para
Deus.”
Neste trecho, percebe-se a solicitude de Santa Dulce para com o próximo, bem como a sua mistagogia, isto é, a sua preocupação de evangelizar e de fazer com que todos adentrassem no mistério Divino. Nesta perspectiva, Santa Dulce não se contentava com uma teoria dissociada da vida prática. A sua evangelização não era marcada pela boa oratória para anunciar a Palavra de Deus. Contudo, anunciava através do testemunho de vida doada, totalmente abnegada de si mesma, de modo que, diversas vezes, repetia e escrevia às irmãs:
“Quanto
mais nos darmos a Deus, com os nossos sacríficios, renúncias, amando não a
nossa vida, mas a daqueles que nos cercam, pessoas tão carentes, chegaremos,
por esta doação total, a dizer como São Paulo: Vivo, já não sou eu quem vive, é
Cristo que vive em mim.”
Não se encontra, nos Escritos de Santa Dulce, nenhuma referência teórica no que se refere ao uso da Palavra de Deus. No entanto, sua vida nos ensinou como deve ser colocada em ação a Sagrada Escritura que se não sai do papel, se torna estéril. Toda a vida de Santa Dulce foi uma exegese viva da palavra de Deus.
No documento Vita Consecrata (João Paulo II, VC, par. 82), assim se lê: “Servir os pobres é ato de evangelização e, ao mesmo tempo, sinal de fidelidade ao Evangelho e estímulo de conversão permanente para a vida consagrada”. Desse modo, o “Anjo Bom do Brasil”, anunciava Jesus Cristo com o próprio testemunho de vida e orientava insistentemente as suas filhas espirituais a serem Evangelhos vivos, isto é, que a própria forma de vida das irmãs fosse um anúncio da Boa Nova.